Nos últimos anos tenho o prazer de trabalhar com as turmas iniciais, os calouros dos cursos de Ciências Sociais e Filosofia. Embora as aulas sejam sempre às sextas-feiras e haja percalços, é uma alegria vê-los participativos, dedicados e interessados em aprender. Lembro-me de quando era graduando, com um mundo a descobrir. Concentrava-me na fala dos professores, anotava tudo que podia e lia com a curiosidade de uma criança a descortinar o mundo.
Cada aula e leitura alimentavam a expectativa do aprendizado, sentia-me um ser em transformação. O melhor, porém, foi aprender a aprender, ou seja, a certeza de que sempre há algo a aprender e que é finita a capacidade de apreender. Aprendi a manter uma atitude intelectual fundada na humildade dos que sabem que não sabem e, consequentemente, a curiosidade inerente ao neófito. O processo de aprendizado tornou-se contínuo e prazeroso. Surpreendo-me diante das descobertas e redescobertas nas obras e textos que leio, nos filmes que assisto e em minha práxis docente. Se cada vez mais me convenço dos limites e insuficiências do que sei, também me acalenta saber que continuo aprendendo e que este aprendizado é como um vôo que me leva a outros territórios e mares.
Vejo-me em meus alunos, percebo em muitos deles a ânsia pelo conhecimento, o prazer da descoberta, a alegria de sentir a metamorfose da formação intelectual. Alegra-me ainda mais vê-los confrontar os vícios que trazem do ensino médio, a tendência a privilegiarem o conteudismo e a decoreba; contenta-me observá-los ensaiando vôos autônomos e a superar a insegurança e a dependência diante da figura do professor.
Talvez este seja o aluno ideal e a minha percepção seja apenas um vislumbre. Ainda que observe aspectos que a confirma, a realidade da vida me ensinou que o aluno real nem sempre corresponde às expectativas. O erro não é dele, mas da idealização. O aluno real vive numa sociedade que o pressiona a preparar-se para a competição. Assim, é equivocado esperar que desenvolva o amor desinteressado pelo conhecimento. Talvez este seja um dos fatores que explique a desistência.
Que outros aspectos explicariam a renúncia dos estudantes? Esta começa a efetivar-se já no decorrer do primeiro semestre e tende a acentuar-se na passagem para o segundo ano do curso. Por que? Qual a nossa responsabilidade enquanto docentes? Qual a nossa “contribuição” para que desistam? Há várias causas, porém, é de se pensar sobre o que fazemos com os nossos alunos, em especial no primeiro ano da vida acadêmica.*
De qualquer forma, observo que, especialmente no segundo ano, quando trabalho com as mesmas turmas que conheci no ano anterior, o grau de desistência é alto. A experiência mostra também que, entre os formalmente matriculados, a assiduidade é instável, há os “turistas” e aqueles que aparecem mas não acompanham a aula – estão na sala, mas apenas fisicamente.
Em suma, é preocupante a evasão, mas também a apatia e desinteresse dos que ficam. Fico a pensar sobre as motivações que levam a este quadro, pois todos são adultos e indivíduos que optaram por este caminho. Diferentemente do ensino fundamental e médio, tiveram a possibilidade de escolher. Apatia, desinteresse e descompromisso com o curso é também uma forma de desistência.
Na universidade pública é a sociedade que arca com os custos, e cada vaga ocupada significa a impossibilidade de outro estudar. Além disso, o dinheiro gasto na universidade pública poderia ser utilizado em outros serviços públicos. Os alunos tem consciência disto? Nós, professores, estamos dispostos a reconhecer o problema? Quando vamos superar o hábito das reuniões burocráticas, restritas às formalidades, e assumiremos a necessidade de refletir e discutir pedagogicamente? Quando vamos realmente ouvir nossos alunos e tentar compreender os motivos que os levam a desistir. Este é o primeiro passo para encontrarmos as respostas. Por que, enfim, os alunos desistem de estudar?