Não escrevo para convencer ninguém, apenas expresso as minhas opiniões. Recebo comentários elogiosos e críticos dos leitores. Os elogios afagam o ego e as críticas me fazem pensar. Considero normal! Cada indivíduo tem interesses a defender – ainda que em nome da coletividade –, possui uma história de vida singular e abraça uma concepção de vida e do ser no mundo diferentes. Cada um sente e racionaliza sobre a vida e o mundo à sua maneira. Os indivíduos interpretam as palavras de acordo com as suas idiossincrasias. Aquele que emite a mensagem não tem o mínimo controle sobre a interpretação. As palavras provocam reações diferentes.
Se nos identificamos com a escrita do outro é porque expressa o que pensamos e sentimos. De certa forma, o elogio é uma forma de autoconvencimento. Por isso, tendemos à indulgência, a não percebemos os aspectos críticos. No pior dos casos, a abdicação da reflexão nos leva à aceitação cega das palavras que ouvimos e/ou lemos. E não é muito difícil encontrar os adoradores dos pequenos e grandes profetas e os leitores de um livro só! Sempre há quem prefira seguir cegamente slogans proferidos pelos líderes, pois isto poupa o exercício de pensar! A personalidade autoritária alenta os inseguros.
A crítica é fundamental! Sem ela corremos o risco do auto-engano, de nos refugiarmos em nossos castelos de areias e torres de marfim. Sem o questionamento das nossas verdades, anulamos a possibilidade de aprender e alimentamos o auto-engodo. A crítica nos indica caminhos não imaginados, aponta equívocos, faz com que percebamos os limites do nosso raciocínio, mostra outras maneiras de dizer as mesmas palavras. Em suma, a crítica ensina e instiga a pensar. Devemos, portanto, agradecer a quem nos oferece a contribuição de questionar nossas opiniões.
A crítica talvez seja uma forma de elogio. Imagino que o crítico reconheça algum valor em seu interlocutor. Do contrário, por que perderia tempo em criticar? Pessoalmente, considero risível a tal da crítica construtiva. Mas há a crítica e a crítica! O que diferencia é a forma de expressá-la. Parece-me que o fator diferencial é a postura do crítico, isto é, se ele adota um posicionamento dialógico ou não. Infelizmente, em geral as críticas não estabelecem o diálogo entre seres humanos, interlocutores que pensam e sentem diferentemente sobre questões específicas. Sem dialogia, não há debate genuíno, mas sim “verdades” que se contrapõem como irrefutáveis, discursos voltados ao ego ou direcionado aos convertidos.
Há quem adore polemizar! Para muitos, a polêmica é tão necessária como o ar que respira, é o alimento vital para sentir a existência. Para Foucault, a polêmica é uma “figura parasitária da discussão e obstáculo à busca da verdade”. Ela “define alianças, recruta partidários, produz a coalizão de interesses ou opiniões, representa um partido; faz do outro um inimigo portador de interesses opostos contra o qual é preciso lutar até o momento em que, vencido, ele nada mais terá a fazer senão se submeter ou desaparecer”.*
Nestas condições, a polêmica não cumpre papel elucidativo. Concordo com o filósofo francês. Como já disse, não escrevo para fazer cabeça ou converter. Não quero impor a verdade, nem conquistar seguidores. Estou aberto a dialogar e aprender. O melhor critério da verdade ainda é a prática. Na medida em que a polêmica delimita trincheiras instransponíveis e anula o diálogo, não vale a pena polemizar! ** O confronto de egos pode até ser prazeroso para uns, mas não é o meu caso. Sendo sincero, causa-me sofrimento. Não obstante, olhando pelo retrovisor do tempo, vejo que tenho uma capacidade indesejável de atrair polêmicas! Por que?! Ironia da vida!
* FOUCAULT, M. “Polêmica, política e problematizações (1984)”, in FOUCAULT, Michel. Ética, Sexualidade, Política. Organização e seleção de textos, Manoel Barros da Mota. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006. (Ditos e escritos; V), p. 226.